A sabedoria popular diz que a justiça tarda, mas não falha. E essa expressão casa bem com a realidade. Algumas ações judiciais podem se arrastar por décadas nos tribunais brasileiros. Por isso, fica até difícil calcular quanto tempo demora um processo no país.
Hoje vamos analisar os principais fatores que atrasam o trabalho do Poder Judiciário. Também apresentaremos soluções capazes de diminuir a morosidade. Fique conosco para entender os detalhes.
Quantos processos existem no Brasil?
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) monitora com frequência o desempenho do Judiciário. Segundo os dados mais recentes do relatório Justiça em Números, coletados até 31/03/2024, naquele período havia 82,7 milhões de ações judiciais pendentes no país.
Não podemos dizer que se trata de uma situação confortável. A fila está longa demais.
Tempo médio de demora dos processos no Brasil
Conforme o CNJ, o tempo médio para um processo permanecer no acervo dos tribunais é de 4 anos e 3 meses.
Mas o próprio órgão reconhece as limitações metodológicas desse índice. A média não contempla a heterogeneidade das ações, visto que cada uma delas pode seguir uma trajetória diferente.
Por exemplo, existem casos em que a fase de conhecimento é rápida. É possível realizar o julgamento antecipado do mérito, pois apenas os documentos reunidos pelas partes são suficientes. Assim, dá pra reduzir o tempo para o juiz analisar o processo, o que leva ao encerramento dos trâmites em poucos meses.
O problema maior acontece na fase de execução, na qual a parte derrotada deve pagar um valor à vencedora. Essa etapa chega a ser quase três vezes mais demorada que a anterior.
Também tem os recursos. Enquanto alguns processos ingressam no primeiro grau e são resolvidos ali mesmo, nos demais ocorre de uma das partes não ficar satisfeita com o resultado e seguir à segunda instância.
Então, um desembargador pode proferir uma decisão monocrática, quando julga sozinho. Dessa decisão ainda é possível outro recurso, demandando a deliberação de um grupo de desembargadores para uma decisão colegiada (coletiva). Pode haver inclusive recurso às Cortes Superiores, deixando a resolução do conflito cada vez mais distante.
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Tempo de tramitação dos processos no Brasil
Outra questão a observar é que o período médio de um processo em tramitação varia de acordo com a vara onde corre o caso. Compare:
- Estadual: 4 anos e 5 meses;
- Tribunais Superiores: 1 ano e 8 meses;
- Trabalho: 3 anos e 1 mês;
- Federal: 4 anos e 3 meses.
Qual é o tempo máximo que um processo pode durar?
Não existe lei estabelecendo prazo máximo para a duração de um processo judicial. Inclusive, são tantas as variáveis envolvidas que é difícil prever uma data para o fim da tramitação.
Aliás, aqui vai uma curiosidade: o cúmulo das idas e vindas do Judiciário foi notícia em setembro de 2020. Na ocasião, o Supremo Tribunal Federal (STF) encerrou o processo mais demorado da história do Brasil, com 125 anos de duração.
A ação foi apresentada pela Princesa Isabel, argumentando que o Palácio Guanabara tinha sido tomado ilegalmente dos Orleans e Bragança com a instauração da república. Mais de um século depois, o STF entendeu que a atual sede do governo fluminense pertence à União, decidindo que não cabia reparação aos herdeiros da antiga família real.
Saiba mais: Prescrição intercorrente – veja se seu processo corre perigo
Por que os processos demoram tanto no Brasil?
Mas, afinal, por que uma ação judicial demora tanto tempo em nosso país? Os números do CNJ ajudam a entender a situação.
Havia 82,7 milhões de processos em tramitação no início de 2024, certo? No entanto, a quantidade de magistrados em todos os âmbitos do Judiciário era de 18.321. Cada juiz, desembargador ou ministro teria de julgar individualmente mais de 4,5 mil casos para zerar a fila.
Ocorre que a Justiça não opera dessa maneira. A maior parte dos magistrados (85,1%) se encontra nas varas, nos juizados especiais e nas turmas recursais de primeiro grau. Seria interessante, então, que as ações tivessem fim ainda nesse estágio.
Quando se entra com recurso, o processo vai para um grupo mais reduzido: 2.647 desembargadores, ou 14,5% do total de magistrados, distribuídos nos diversos tribunais brasileiros. É menos gente para dar solução aos processos.
E o gargalo fica ainda mais estreito nos tribunais superiores, onde apenas 76 ministros (0,4% dos magistrados) são responsáveis pelas decisões coletivas.
“Quando eu era Ministro do STJ, cheguei a receber de 80 a 100 processos novos por dia!”, revelou Sidnei Beneti, ministro aposentado do Superior Tribunal de Justiça, em reportagem do portal Exame.
Essa informação demonstra o efeito cascata que leva ao congestionamento do Judiciário.
Principais fatores para a demora na conclusão dos processos no Brasil
A matéria também elenca alguns fatores específicos para a demora dos processos no Brasil. Entre eles, destacamos:
1. Baixo número de juízes em relação ao tamanho da população brasileira (8,2 magistrados para cada 100 mil habitantes, enquanto a média em países europeus é de 17,4);
2. Cultura de litígio, que leva a uma judicialização exagerada em detrimento de outras formas de solução de conflito, como a conciliação, a mediação e a negociação;
3. Excesso de pedidos liminares, ações cautelares e mandados de segurança contra decisões judiciais, que retardam indefinidamente a conclusão das ações;
4. Estrutura limitada das instâncias superiores (em razão da grande quantidade de recursos), que não dão conta da alta demanda e travam o sistema;
5. Falta de um mecanismo eficiente para agrupar processos semelhantes e facilitar o julgamento de recursos nos tribunais superiores;
6. Insegurança jurídica. Como as leis são alteradas ou substituídas frequentemente, os cidadãos acabam não sabendo exatamente quais são seus direitos. Portanto, recorrem em demasia ao Poder Judiciário.
Dificuldades para o acesso à Justiça no Brasil
Quando falamos da morosidade, também é importante lembrar do conceito de acesso à Justiça. Ele não se resume a entrar com uma ação na vara mais próxima. A justiça só é feita quando o caso é finalizado, de preferência com rapidez e eficiência.
Cada vez que temos um processo em tramitação por muito tempo, esse acesso é, em certa medida, negado à população. Isso sem contar outras barreiras econômicas, culturais e até físicas que afastam os cidadãos das instâncias do Judiciário.
A lista abaixo não pretende ser exaustiva. Ela apenas traz um apanhado de razões possíveis para esse fenômeno. Acompanhe:
Questões culturais
O sistema Judiciário pode parecer intimidador para quem vê de fora, como apontam Mauro Cappelletti e Bryant Garth na obra Acesso à Justiça. Segundo os autores, muita gente se sente perdida diante dos procedimentos complicados, da formalidade e da “figura opressora” de advogados e juízes.
Não bastasse essa falta de intimidade com o universo jurídico, alguns litigantes ainda têm medo de represália. Imagine, por exemplo, um agricultor que more na fazenda onde trabalha. Essa relação de dependência com o dono das terras acaba o inibindo de processar o patrão, mesmo que direitos trabalhistas estejam sendo violados.
Questões econômicas
No país persiste a ideia de que é necessário ter dinheiro para entrar com uma ação judicial. Esse mito pode ser fruto do desconhecimento, ou mesmo das relações sociais do indivíduo. Se ele não convive com nenhum advogado, como saber a quem recorrer?
Nesse ponto, vale a pena destacar o papel da Defensoria Pública. O órgão oferece orientação jurídica e defesa gratuita a cidadãos sem condições financeiras de pagar pelo serviço. A atuação inclui mutirões, realizados em comunidades rurais ou bairros afastados dos centros urbanos, o que garante o acesso à Justiça a um grupo maior de pessoas.
Questões físicas
Falando em distância, a própria localização geográfica pode ser complicadora. Quem vive longe da cidade enfrenta um caminho literalmente mais longo até chegar ao fórum. O trajeto, além de demorado e cansativo, pode ser muito oneroso quando se depende de transporte público.
Outro ponto importante diz respeito à acessibilidade. Uma escadaria na entrada do prédio dificulta o acesso físico de cadeirantes, idosos e pessoas com mobilidade reduzida. Já a falta de intérprete de Libras pode impedir a comunicação de uma pessoa surda com os funcionários do lugar. Todos esses elementos acabam sendo impeditivos para o sujeito ir em busca de seus direitos.
Judicialização no país
Fora os fatores citados anteriormente, o acesso à Justiça no Brasil esbarra na morosidade do Judiciário. Como os processos demoram demais para ser julgados, há quem simplesmente desista de tentar. É que todo o esforço para coletar provas, comparecer a audiências e prestar depoimentos pode ser emocionalmente desgastante, ainda mais se as chances de resultado favorável forem baixas.
Cabe salientar que não estamos acusando juízes, desembargadores e ministros de incompetência. O que acontece é um excesso de demanda, fruto de nossa cultura de litígio e de um sistema com muitos gargalos, como mostramos anteriormente.
O que fazer para evitar um processo demorado
A Justiça brasileira tem feito avanços no que diz respeito à produtividade dos tribunais. Um exemplo é a digitalização dos documentos, que atribuiu mais agilidade aos processos.
Outras iniciativas podem partir tanto dos advogados quanto das partes. Elas incluem:
1. Priorizar soluções alternativas
Acordos extrajudiciais e audiências de conciliação são excelentes para solucionar pequenos conflitos. Essas alternativas poupam o tempo dos envolvidos, consomem menos recursos e encerram o caso mais cedo, desafogando os tribunais. Veja as diferenças:
Mediação – Essa audiência consiste numa conversa entre as duas partes. Cada uma apresenta sua solução possível para o conflito. Depois cabe ao mediador, profissional neutro e isento, conduzir o diálogo para a construção conjunta de um acordo.
A alternativa da mediação costuma ser utilizada quando há envolvimento prévio entre as pessoas. Por exemplo, ex-cônjuges ou empregador e empregado.
Conciliação – A figura do conciliador atua de maneira mais ativa na solução do conflito, oferecendo caminhos caso as partes não consigam chegar a um consenso. De resto, a dinâmica é similar à da mediação, tanto que ambas as modalidades são previstas pelo mesmo artigo (165) do Código de Processo Civil.
Arbitragem – Nesse procedimento, cada parte escolhe um ou mais árbitros para representá-la. Os profissionais defenderão os interesses de seus clientes e buscarão um fim para o desentendimento, mas sem chegar às vias judiciais. A alternativa é regida pela Lei 9.307/96.
Em tempo: a Resolução 358 do CNJ regulamenta a criação de soluções tecnológicas para a mediação e a conciliação. Assim, abre-se espaço para audiências on-line. Embora grande parcela da população tenha dificuldade de acesso à internet, não se pode negar que se trata de um importante avanço para agilizar a resolução de conflitos.
2. Redigir peças objetivas
O Direito está atrelado a uma tradição muito forte de mostrar intelectualidade e erudição nos autos. Isso faz com que alguns profissionais da área deixem a objetividade de lado. Trata-se de um erro a se evitar.
Em vez de palavreado bonito, é importante que a peça contenha jurisprudências, provas e dispositivos legais diretamente relacionados ao assunto. Um texto objetivo tomará menos tempo do juiz, garantindo uma apreciação mais rápida do caso.
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3. Protocolar a ação o quanto antes
O advogado e seu cliente devem administrar bem o tempo de trabalho. Se a peça for protocolada no último dia do prazo, o andamento da ação ficará comprometido. Portanto, quanto mais cedo as demandas forem resolvidas, mais cedo chegará o desfecho do processo.
4. Vender o crédito judicial
Quem tem ganho de causa num processo precisa aguardar a fase de execução da sentença. Como dissemos antes, essa etapa costuma ser mais longa que o período de conhecimento das provas.
Numa situação assim, a cessão de crédito judicial funciona como uma estratégia para antecipar o pagamento do título. A operação se baseia numa espécie de venda. Explicamos tudinho no artigo abaixo.
Saiba mais: Veja como vender seus créditos judiciais
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No mais, esperamos que o conteúdo de hoje tenha sido útil. Continue acompanhando nosso blog para conferir novos artigos sobre o Poder Judiciário. Até a próxima!